domingo, 13 de junho de 2010

As Torres Gêmeas

Se há algum espelho da História presente nos concursos de miss, ele certamente não reflete, com mero embelezamento, os fatos. Os horrores vividos no tempo histórico são, um a um, convocados e trazidos à passarela – mas sempre pelo viés do absurdo, ou da ironia.



E foi assim, com esgares de absurdo e de ironia, que Osama bin Laden teve que esperar pelo cabalístico número de 7 anos para ver espelhada, nos concursos de miss, a sua grandiloqüente performance multimidiática de desmoronamento dos falos duros da economia estadunidense.

Quando a negra Cristle Stewart (que passara anos lutando e sendo derrotada em concursos menores para chegar, enfim, a carregar a faixa USA) caiu de bunda no chão do desfile de trajes de gala do Miss Universo 2008, fazia aproximadamente 7 anos que as torres gêmeas haviam desabado.

Não por acaso (o espírito do tempo brinca tão sorrateiro com essas ironias!), no ano anterior, durante o mesmo desfile de EG (Evening Gown Competition) do Miss Universo 2007, outra afro-descendente norte-americana havia derrubado suas reais chances de vitória ao espatifar-se, também esquentando as nádegas, na fase mais elegante do concurso.

Ela era Rachel Smith, uma simpática Miss Tennessee que Donald Trump elegeu Miss USA. E que garimpou, mesmo após sua dolorosa queda (seguida de um emblemático sorriso digno de nota – mesmo com o derrière latejante –, após a rápida levantadinha), uma aguerrida classificação para as finais (ou Top 5).

Tudo isso ocorreu sob constrangedoras vaias de uma multidão presente na platéia – e que assistira a sua fraca candidata parar no Top 10, perdendo a vaga justamente para a decaída Smith. Os anfitriões mexicanos que, para além do ódio ao país vizinho (cultivado por razões econômicas óbvias, que envolvem muros nas fronteiras e clara xenofobia latina), protagonizaram uma das melhores demonstrações de rejeição à era Bush Filho, em rede mundial de TV aberta.

No ano seguinte, quando Cristle Stewart despencou, os jurados não foram tão lenientes. Afinal, estávamos do Vietnam – e não pega bem, justo ali, ser condescendente com o peso da faixa USA. A moça parou no Top 10 (a fraquíssima Miss Vietnam já tinha interrompido as esperanças no Top 15), metaforizando a melancólica queda da segunda torre de 11 de setembro de 2001.

Quando a primeira caiu, ficamos estarrecidos com o acontecimento. Quando a segunda, de modo simétrico, mostrou como a realidade pode verdadeiramente copiar a ficção (sobretudo o cinema!), não imaginávamos poder ver um incômodo repeteco, diante do mundo via NBC, e agora tão divertido, nas passarelas mais fúteis da mídia contemporânea.

Como escreveu Jean Baudrillard sobre as Twin Towers (Donald Trump também tem suas duas torres luxuosas): “Imaginem se elas não tivessem desabado, ou que apenas uma delas desabasse, o efeito não seria de modo algum o mesmo. A prova gritante da fragilidade da potência mundial não teria sido a mesma”.

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